Há uns dias fui
ao centro comercial Colombo. Fui por obrigação profissional, porque ninguém me
apanha ali por opção. Lido mal com espaços muito grandes e tenho graves
problemas de orientação em estacionamentos, de maneira que vou lá o mínimo
possível.
Mas fui.
Felizmente acompanhada.
Apesar de ter Via
Verde no carro, nem sei bem porquê, tirei um bilhete à entrada do estacionamento.
Guardei-o religiosamente, ciente da gigantesca probabilidade de lhe perder o
tino. Fixei o lugar, tudo direitinho, e quando saímos, Milagre! eu sabia onde estavam
ambos – o carro e o bilhete. Dirigi-me a uma caixa automática, abri a
carteira e verifiquei que não tinha um tostão. Já a minha amiga sacava da
carteira quando reparei que a caixa do lado permitia pagamentos com cartão
multibanco. Toda contente lá fui experimentar, nunca tinha utilizado uma
máquina daquelas.
Correu bastante
bem, foi rápido e viemos embora. Quando estávamos quase no carro lembrei-me que
tinha deixado o bilhete pago na máquina. Voltamos atrás, a minha amiga
perguntou ao senhor que estava a pagar se por acaso o tinha encontrado e o
senhor estendeu-lho.
Agradecemos
aliviadas, voltamos para o carro e arrancamos em busca de uma saída. Já disse
que detesto aquele centro comercial e esta é uma das razões: podemos morrer de
fome e sede e afogar-nos em xixi antes de encontrarmos uma saída. Mas depois de
voltas e mais voltas lá conseguimos. Enfiei o bilhete na ranhura e apareceu uma
mensagem antipática a dizer vire o
bilhete. Nem se faz favor nem
nada, só assim: vire o bilhete. E eu
virei. Mas a mensagem apareceu de novo: vire
o bilhete. E eu virei. E fui virando o bilhete de um lado para o outro, de
cima para baixo, mas a máquina continuava casmurra: vire o bilhete. O par de carros atrás de nós começou a compor-se numa
fila jeitosa e eu decidi tocar à campainha a pedir ajuda. Enquanto esperávamos os
stressados da fila começaram a buzinar, aquelas cenas do costume como se
ajudassem alguma coisa. Lá apareceu um rapazinho todo simpático que olhou para
o meu bilhete e disse: “minha senhora, isto não é o bilhete, é o recibo”.
Como o recibo? E
o bilhete onde estaria então? Na máquina, talvez. Sugeriu então que eu voltasse
atrás para ver se o encontrava. Eu olhei para ele com atenção, só para
verificar se ele não estava a gozar comigo. Então como poderia eu saber qual
era a máquina onde tinha feito o pagamento? Ele nem tinha a noção do milagre
que era eu ter encontrado o carro, quanto mais. Além disso, se eu tinha ali o
comprovativo do pagamento não bastava para me abrirem a cancela? Aparentemente
não.
Estávamos num
impasse, de maneira que o rapaz lá mandou os carros andarem para trás, eu tirei
o meu do caminho, e eis que a minha genial amiga com memória ao retardador, saca
do telemóvel onde tinha uma fotografia do lugar onde tínhamos estacionado.
Subi para o
carrinho de golfe com o meu amiguinho novo, percorremos o parque durante o que
me pareceu uma meia hora, e lá encontramos a máquina. Procuramos nas ranhuras
todas, em cima, debaixo, no lixo, mas nada. Então ele concluiu que talvez o bilhete
tivesse ficado preso no interior da máquina, mas para a abrir teria de ser o
superior. Comunicou via rádio e lá surgiu então outro carrinho com o dito superior
que escarafunchou nas entranhas do aparelho até concluir que dos 27 bilhetes
que lá estavam nenhum era meu.
“Teremos de fazer
o procedimento de bilhete perdido”, concluiu ele. Aí confesso que a tampa me
saltou um nadinha. Pois se eu tinha na mão um comprovativo do pagamento com o
dia, a hora e, como tinha pago com o multibanco, o meu nome escrito…
Aí ele ficou
baralhado, contactou via rádio outra vez e, enquanto aguardava por um veredicto
qualquer, o meu telemóvel tocou. Meti a mão dentro da mala e quando a tirei, oh
surpresa! sai-me o bilhete do parque.
O senhor olhou
para mim, eu olhei para ele, sorrimos os dois, eu desfiz-me em desculpas e lá
fomos no carrinho de golfe de regresso à casa da partida, com ele a dizer
piadas sobre outros incidentes que já lhe tinham acontecido envolvendo pessoas
idosas.
É claro que,
quando inseri o bilhete na ranhura para finalmente sair do parque, o tempo
tinha passado – teria de ir fazer novo pagamento.
Não sei se ele tinha mais o que fazer ou se foi da minha expressão, entre o desesperado e a bomba relógio, mas ele abriu a cancela e deixou-nos
sair.